Crowdfunding – O regime jurídico do financiamento colaborativo

Escrito por Conselhos do Consultor

05.11.15

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5 min de leitura

“A Lei n.º 120/2015 de 24 de Agosto aprovou o Regime Jurídico do Financiamento Colaborativo, comummente designado por crowdfunding.
Como flui da exposição de motivos do Projecto de Lei n.º 419/XII, que originou o presente Diploma, “o financiamento às empresas é dos principais problemas que o País enfrenta. Sem uma forma de o ultrapassar dificilmente conseguiremos sair da crise económica em que nos encontramos e retomar o caminho do crescimento e do emprego. De facto, nenhuma estratégia de crescimento económico, de promoção de emprego, de industrialização ou de reforço na produção de bens transaccionáveis será bem-sucedida sem que encontremos uma resposta para esta questão”.
Por conseguinte, a Lei n.º 120/2015 de 24 de Agosto, tem como fito combater os dados estatísticos fornecidos pelo Banco de Portugal que confirmam a redução constante do financiamento, revelada através de uma quebra mensal no crédito concedido às pequenas e médias empresas de 8,3 %, num momento em que o sistema bancário efectivamente não liberta os recursos necessários para estimular a tão almejada actividade económica.
Consciente dessa problemática, o crowdfunding é lançado com o desiderato de permitir a viabilização das empresas, criando e salvaguardando emprego, para além de captar recursos indispensáveis à nossa economia.
Dar conta do state of art do assunto passa por referenciar que pese embora não esteja formalmente legalizado, o crowdfunding já é uma prática corrente no nosso país, estendendo a sua área de actuação a inúmeras áreas, destacando-se as campanhas de sensibilização e o financiamento de trabalhos musicais de artistas portugueses, até porque na miríade do crowdfunding existe uma infinidade de tipos de projectos.
O artigo 2.º do Diploma estatui que “financiamento colaborativo é o tipo de financiamento de entidades, ou das suas actividades e projectos, através do seu registo em plataformas electrónicas acessíveis através da Internet, a partir das quais procedem à angariação de parcelas de investimento provenientes de um ou vários investidores individuais.”
Concomitantemente, prescreve o artigo 3.º que as modalidades de financiamento colaborativo são as seguintes:
a) O financiamento colaborativo através de donativo, pelo qual a entidade financiada recebe um donativo, com ou sem a entrega de uma contrapartida não pecuniária;
b) O financiamento colaborativo com recompensa, pelo qual a entidade financiada fica obrigada à prestação do produto ou serviço financiado, em contrapartida pelo financiamento obtido;
c) O financiamento colaborativo de capital, pelo qual a entidade financiada remunera o financiamento obtido através de uma participação no respectivo capital social, distribuição de dividendos ou partilha de lucros;
d) O financiamento colaborativo por empréstimo, através do qual a entidade financiada remunera o financiamento obtido através do pagamento de juros fixados no momento da angariação.
No que concerne à titularidade de plataformas de financiamento colaborativo, o legislador optou por permitir apenas às pessoas colectivas ou estabelecimentos de responsabilidade limitada, consagrando expressamente os deveres das plataformas, maxime:
a) Assegurar aos investidores o acesso a informação relativa aos produtos colocados através dos respectivos sítios ou portais na Internet;
b) Assegurar a confidencialidade da informação que receberem dos investidores;
c) Assegurar o cumprimento das normas da presente lei e da demais regulamentação aplicável;
Relativamente aos beneficiários, podem recorrer às plataformas de financiamento colaborativo quaisquer pessoas singulares ou colectivas, nacionais ou (até) estrangeiras, interessadas na angariação de fundos para os seus projectos ou actividades. A adesão é realizada por contrato reduzido a escrito e disponível de forma desmaterializada através de plataforma, do qual deve constar a identificação das partes, as modalidades de financiamento colaborativo a utilizar, a identificação do projecto ou actividade a financiar e o montante e prazo da angariação, bem como os instrumentos financeiros a utilizar para proceder à angariação.
Neste sentido, destaque ainda para o artigo 10.º, definindo que os contratos celebrados entre beneficiários do financiamento e investidores estão sujeitos às normais legais aplicáveis aos contratos em causa, mormente, a doação, compra e venda, prestação de serviços, emissão e transacção de valores mobiliários, mútuo, bem como as disposições sobre protecção da propriedade intelectual, quando relevantes.
Da disciplina legal deste instituto resulta ainda que as plataformas de financiamento colaborativo através de donativo ou recompensa devem comunicar previamente o início da sua actividade à Direcção-Geral do Consumidor, e que o acesso à actividade de intermediação de financiamento colaborativo de capital ou empréstimo é realizado mediante registo prévio das entidades gestoras das plataforma electrónicas junto da CMVM, sendo esta a entidade responsável pela regulação e supervisão da sua actividade.
Saliente-se ainda que a presente lei entra em vigor no dia 01 de Outubro de 2015, com excepção das disposições relativas ao financiamento colaborativo de capital ou empréstimo, que entrarão em vigor aquando da entrada em vigor das normas regulamentares a serem emitidas pela CMVM.
Parece-nos insofismável que o crowdfunding possui um enorme potencial para se tornar num importante vector de crescimento económico, visando uma ligação mais estreita entre quem está disponível para financiar e quem necessita desse financiamento, do que a tradicional actividade de intermediação financeira, principalmente num momento em que a banca permanece reticente a atribuir crédito às empresas, ao mesmo tempo que incita as pessoas a investirem, contribuindo para reforçar o espírito empresarial.
Atendendo a todas as considerações precedentes, é de louvar a iniciativa do nosso legislador, atento ao crescimento exponencial do crowdfunding que no ano de 2012 já movimentava cerca de 2,8 milhões de dólares em todo o mundo”.

Miguel Cunha Machado

Miguel Cunha Machado <mcm@sociedadeadvogados.eu>

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