Arrendamento Vitalício: como funciona?

Escrito por Conselhos do Consultor

02.08.21

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9 min de leitura
Arrendamento Vitalício

O contrato de arrendamento vitalício permite às famílias manter a sua habitação por um período de tempo prolongado. Descubra como funciona este regime e quais são as vantagens e obrigações.

Oficialmente designado como Direito Real de Habitação Duradoura, o contrato de arrendamento vitalício surge com o objetivo de criar uma solução de habitação estável. Este regime surge da necessidade de alterar as políticas atuais de habitação para dar resposta às alterações do modo de vida e condições socieconómicas das famílias em Portugal. Neste artigo explicamos-lhe como tudo funciona.

Como funciona o arrendamento vitalício?

O Direito Real de Habitação Duradoura (DHD) foi criado pelo Decreto-Lei n.º1/2020 de 9 de janeiro e permite o direito permanente de residência numa habituação durante toda a vida. Esta medida surge como uma alternativa às soluções de aquisição de habitação própria ou de arrendamento habitacional, uma vez que o morador não tem de adquirir a propriedade da habitação. E como funciona na prática? O DHD consiste num contrato celebrado entre o proprietário da habitação e uma ou mais pessoas singulares (moradores) que estabelece o direito de arrendamento vitalício, mediante o pagamento de uma caução e de uma prestação mensal ao proprietário. 

Quando se realiza o contrato, o morador deve pagar as quantias relativas à caução e à primeira prestação mensal. A prestação mensal é estabelecida livremente, tal como acontece num arrendamento normal. Contudo, a caução deve obrigatoriamente fixar-se entre um mínimo de 10% e um máximo de 20% do valor médio da venda de mercado do imóvel. Apesar da exigência da caução, há boa uma notícia: o morador pode desistir do contrato e reaver a totalidade da caução, mas apenas no caso de ter permanecido na habitação durante 10 anos. Contudo, a partir dos 10 anos, passa então a perder 5% do valor total da caução por cada ano de permanência. Passados 30 anos de permanência, o morador perde o direito à caução, mas mantém o direito de arrendamento vitalício. Ou seja, no final do 30.º ano a totalidade da caução terá sido paga ao proprietário.

O contrato de arrendamento vitalício é livremente celebrado entre o proprietário e o morador, não havendo assim requisitos especiais nem candidaturas.

Quais as vantagens?

O DHD traz vantagens significativas para moradores e proprietários, tal como se pode ler no portal do Governo:
  • Permite aos moradores permanecer na mesma habitação durante períodos prolongados, podendo até ser uma solução vitalícia se assim o desejarem;
  • Concilia as necessidades das famílias em termos de estabilidade e de segurança na ocupação do alojamento com as de flexibilidade e mobilidade habitacional, fruto das dinâmicas pessoais, familiares e profissionais (alteração do local de trabalho, divórcio e reagrupamento familiar, etc);
  • Os moradores podem renunciar ao direito em qualquer momento, sendo que nos primeiros 10 anos é-lhes devolvida a totalidade da caução paga;
  • Reduz a necessidade de endividamento das famílias (em comparação com o endividamento por aquisição);
  • Constituiu uma alternativa para as faixas etárias mais vulneráveis da população no que respeita ao acesso à habitação: os mais jovens, com menor capacidade de investimento e maiores necessidades de mobilidade, e os idosos, que já não conseguindo aceder a crédito hipotecário carecem de fortes condições de segurança e de estabilidade habitacional.
  • Oferece ao proprietário uma oportunidade de capitalização de muito baixo risco, dado quando o incumprimento reiterado das obrigações do morador é causa de resolução do contrato, os montantes em dívida podem ser deduzidos ao saldo da caução a devolver ao morador e com o direito a que o imóvel lhe seja devolvido com um estado de conservação.
  • Implica encargos e necessidades de gestão reduzidos para os proprietários, em comparação com o arrendamento, dado que as obras de conservação ordinária estão a cargo do morador, bem como o pagamento do IMI.

Quais as obrigações?

Apesar das vantagens, os moradores e proprietários devem respeitar as suas obrigações para que o DHD funcione da melhor forma, tal como consta no Decreto-Lei n.º1/2020:

Obrigações dos Proprietários

a) Assegurar que a habitação é entregue ao morador em estado de conservação, no mínimo, médio;

b) Pagar, na parte relativa à habitação, os custos de obras e demais encargos relativos às partes comuns do prédio e, no caso de condomínio constituído, pagar as quotizações e cumprir as demais obrigações enquanto condómino;

c) Assegurar a vigência, a todo o tempo, de seguros relativos ao prédio e à habitação que sejam legalmente obrigatórios;

d) Realizar e suportar o custo das obras de conservação extraordinária na habitação, salvo se as anomalias existentes resultarem de atos ilícitos e ou do não cumprimento de obrigações por parte do morador;

e) Gerir o montante recebido a título de caução e, com a extinção do DHD, assegurar a sua devolução ao morador nos casos e termos previstos no decreto-lei.

Obrigações dos Moradores

a) Utilizar a habitação exclusivamente para sua residência permanente;

b) Pagar as taxas municipais e entregar ao proprietário do imóvel os montantes relativos ao Imposto Municipal sobre Imóveis;

c) Promover ou permitir a realização das avaliações do estado de conservação da habitação previstas no presente decreto-lei e, salvo nos casos da avaliação prévia prevista no artigo 4.º e no n.º 3 do presente artigo, pagar o respetivo custo;

d) Realizar e suportar o custo das obras de conservação ordinária na habitação;

e) Consentir ao proprietário a realização das obras a que este está obrigado de acordo com a alínea b) do artigo anterior e informá-lo logo que tenha conhecimento da existência de anomalias na habitação cuja reparação seja obrigação do mesmo.

O contrato de arrendamento vitalício pode terminar?

Apesar do contrato de arrendamento ser vitalício, isso não significa que não possa terminar. Assim, o DHD termina com:

  1. O incumprimento definitivo do morador ou proprietário (por exemplo: o morador deixa de pagar a prestação mensal);
  2. A decisão de não permanência por parte do morador;
  3. Com a morte do morador ou, se constituído a favor de mais do que uma pessoa, com a morte do último deles.

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Leia também: Como rescindir o Contrato de Arrendamento: regras e prazos

Arrendamento Vitalício – Exemplo prático

No sentido de clarificar como funciona na prática o contrato de arrendamento vitalício, deixamos a seguir um exemplo elaborado pela Teixeira Advogados & Associados para o portal Idealista:

 

O Fernando e a Maria viram no jornal que entrou em vigor o regime do DHD e acharam que esta seria uma boa alternativa ao arrendamento ou à compra de uma casa para morarem.  

Foram ter com Telmo, que é proprietário de uma casa que se encontra desocupada e livre de hipotecas e outros ónus ou encargos, e propuseram-lhe a celebração de um contrato nesse sentido. Telmo aceita e pede a um arquiteto ou a um engenheiro que avalie o estado de conservação da habitação. Depois de confirmadas as condições médias de conservação da casa, Maria e Fernando concordaram em receber a casa nas condições em que esta se encontrava, bem como acordaram com o Telmo que a caução inicial teria um valor total de 10.000 euros e que as prestações mensais seriam de 100 euros. 

Dirigiram-se a um escritório de advogados e expuseram a sua vontade em realizar o acordo, tendo sido então o contrato elaborado e, no dia 4 de agosto de 2020, foi assinado e foram reconhecidas as assinaturas presencialmente. Nesse momento, o Fernando e Maria transferiram o montante de 10.100 euros para a conta do Telmo, referentes ao valor da caução e ao valor da primeira prestação mensal. Por fim, o Fernando e a Maria inscreveram o contrato no registo predial. 

Daqui para a frente e até 4 de agosto de 2030, Fernando e Maria apenas terão de pagar 100 euros por mês. A partir de 4 de agosto de 2031, Fernando e Maria, até 4 de agosto de 2050, terão de pagar 100 euros por mês e a prestação anual que corresponde a 5% da caução inicial. Tendo a caução inicial o valor de 10.000 euros, terão então de pagar, além dos 100 euros por mês que já estavam a pagar, mais 500 euros por ano.

Acontece que estes 500 euros por ano não saem efetivamente da conta do Fernando e da Maria. Eles são descontados da caução que estes prestaram inicialmente. O que significa que a 4 de agosto de 2050, o Telmo já nada terá de devolver a Fernando e a Maria a título de caução, porque foi descontando desta o valor da prestação anual (500 euros x 20 anos = 10.000 euros).

Perguntas e Respostas

Imaginemos agora que o Fernando e a Maria querem a restituição da sua caução. Conseguirão? 

Sim. Se saírem do imóvel, têm direito a reavê-la integralmente nos primeiros 10 anos (até 4 de agosto de 2030). Caso o morador permaneça no imóvel a partir do 11.º ano, o proprietário passa a reter uma percentagem de 5% por ano, o que significa que ao fim dos 30 anos os moradores perdem todo o direito à caução: assim, se saírem do imóvel, por exemplo em 2031, ser-lhes-á restituído apenas o valor de 9.500 euros.

E em que caso poderá Telmo ficar com a quantia que lhe foi paga a título de caução? 

No caso de cessação do contrato, quando existam quantias em dívida devido ao não cumprimento pelo morador das suas obrigações, o proprietário pode deduzi-las do montante do saldo da caução a devolver ao morador. Por exemplo, se Fernando e Maria não tivessem pago a prestação mensal de 100 euros nos últimos três meses, e ainda estivéssemos nos primeiros 10 anos de contrato, Telmo apenas lhes devolveria 9.700 euros.

 

Se lhe restar alguma dúvida sobre o funcionamento do contrato de arrendamento vitalício, aconselhamos que consulte o Decreto-Lei n.º1/2020 de 9 de janeiro.

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Leia também: Já conhece o Programa de Arrendamento Acessível?

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